Quem foi Martin Luther King?
Em 4 de abril de 1968, o mundo perdia um sonhador. Cinco décadas depois, suas palavras continuam a inspirar os defensores da igualdade de direitos (foto: Wikimedia)
“Eu tenho um sonho.” Martin Luther King será sempre lembrado por seu famoso discurso e por seu grande sonho: negros e brancos vivendo em paz uns com os outros, liberdade e justiça sendo desfrutadas por todos os americanos, e seus quatro filhos vivendo em um país onde não são julgados pela cor da pele, mas por seu caráter.
Com tal ideal, King entrou para a história. Mais de 250 mil norte-americanos, incluindo brancos, acompanharam seu discurso durante a Marcha sobre Washington, em 23 de agosto de 1963. O objetivo de King era fortalecer os direitos dos negros e chamar atenção para os problemas cotidianos por eles enfrentados.
Com seu discurso e suas ideias, King inspirou os cidadãos, estimulando-os a imaginar uma coexistência mais justa entre negros e brancos. Ele próprio vivenciou a segregação racial desde cedo. Nascido em 15 de janeiro de 1929, em Atlanta, na Geórgia, sob o nome de Michael King Jr., filho de um pastor e de uma professora, ele passou grande parte da infância brincando com dois vizinhos brancos – até que um dia seus pais o proibiram de ver os amigos.
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Mas King não se deixou abalar. Tanto na escola quanto nos estudos de Sociologia e na Teologia, ele brilhou, mesmo que, após sua morte, tenha vindo à tona que ele plagiou partes de sua tese de doutorado. Aos 17 anos, ele se tornou pastor assistente do pai em Atlanta. Tanto pai quanto filho tinham uma profunda fé em Deus, o que acabou manifesto em seus nomes.
Em 1934, King Pai viajou para Berlim para participar do Congresso Mundial Batista. Durante a viagem, ele aprendeu muito sobre o reformador Martinho Lutero e ficou fascinado. Ao voltar para casa, King Pai mudou seu nome e o nome do filho para Martin Luther King.
O filho não se interessava apenas por religião. Ele também lia Aristóteles, Platão e Marx e gostava particularmente dos escritos de Mahatma Gandhi. “Através do foco de Gandhi no amor e na não violência, descobri o método de reforma social que eu buscava”, disse King. Em 1953, ele se casou com Coretta Scott Williams, com quem teve quatro filhos.
King se engajou de fato pela primeira vez depois que a ativista negra dos direitos civis Rosa Parks foi presa em 1955 por se recusar a dar lugar para um homem branco em um ônibus público em Montgomery, no Alabama.
Por mais de um ano, King e outros ativistas boicotaram ônibus públicos. A resistência foi bem-sucedida: em 1956, a Suprema Corte proibiu a segregação racial no transporte público de Montgomery. No ano seguinte, King fez dezenas de discursos e escreveu um livro sobre suas experiências na cidade.
King também apoiou os integrantes das chamadas Freedom Rides (Viagens da Liberdade) na Geórgia, nas quais os negros se manifestavam em pequenos grupos e de maneira pacífica contra a segregação no espaço público.
Por fim, os protestos da população negra em todo o país acabaram por surtir efeito. Em junho de 1963, o então presidente, John F. Kennedy, apresentou a Lei dos Direitos Civis, que previa igualdade ampla e nacional. Um ano depois, após o assassinato de Kennedy, o novo presidente, Lyndon B. Johnson, ratificou a lei.
Apesar dos desdobramentos políticos, King e outros líderes de vários movimentos de direitos civis não desistiram de sua manifestação em Washington, programada para 28 de agosto de 1963. Caso contrário, o famoso discurso “Eu tenho um sonho” (I have e dream) de Martin Luther King em frente ao Lincoln Memorial provavelmente nunca teria acontecido.
Um ano depois, King recebeu o Prêmio Nobel da Paz. Mas sua luta pela igualdade de direitos não parou por aí. A igualdade racial existia apenas no papel, razão pela qual ele organizou em 1965 as Marchas de Selma a Montgomery, no Alabama, a fim de chamar a atenção para a desigualdade entre brancos e negros quanto ao direito ao voto.
As marchas foram reprimidas pela polícia diversas vezes, mas acabaram alcançando a cidade vizinha. Na sequência, o presidente Lyndon Johnson mudou de ideia e se disse favorável a uma nova lei eleitoral. A Lei dos Direitos de Voto foi aprovada pelo Congresso no verão de 1965.
Enquanto isso, grupos violentos se organizavam sobretudo em cidades na Califórnia e nos estados do norte. Para eles, o progresso era muito lento. Desilusão e decepção se alastraram até que finalmente Malcolm X e o Partido dos Panteras Negras colocaram em xeque as ideias não violentas de Martin Luther King.
Mas King não desistiu. Seguindo o exemplo de Lutero, ele pregou, após um discurso em 1966, 48 teses na porta da Prefeitura de Chicago. Inicialmente, lá também houve resistência a King, que não deveria interferir nos interesses dos negros em Chicago. Mas King permaneceu firme. Do mesmo modo, suas mais de 30 detenções não o desviaram de sua convicção.
King não encontrou rejeição apenas entre a população. Durante anos, ele teve um relacionamento difícil com o FBI, o principal órgão investigativo do Departamento de Justiça. O FBI o interrogou, considerou-o comunista.
Além disso, os investigadores ameaçaram publicar informações privadas do ativista, incluindo suas infidelidades, se ele não parasse de fazer campanha pelos direitos civis dos negros. King acusou o FBI de não fazer nada diante da violência contra os negros.
Mas novamente King não se intimidou. O FBI não conseguiu interromper seu trabalho, somente James Earl Ray conseguiria tal feito. O racista diversas vezes condenado atirou em King no dia 4 de abril de 1968 na varanda de um hotel em Memphis, Tennessee. King tinha 39 anos de idade.
O assassinato provocou revoltas significativas em muitas cidades dos EUA. Um total de 39 manifestantes foram mortos, e cerca de 10 mil, presos.
Até hoje, King é considerado um herói da história norte-americana, e seus sonhos acompanham muitos negros nos Estados Unidos, incluindo sua neta Yolanda Renee King, que só recentemente apareceu em público.
No último dia 24 de março, durante a marcha pelas nossas vidas, em Washington, ela expressou seus desejos: “Meu avô sonhou que seus quatro netos não seriam julgados pela cor da pele, mas pelo caráter deles. Eu tenho um sonho de que já basta. De que este deveria ser um mundo livre de armas e ponto”, disse a menina de nove anos, não muito longe do lugar onde o avô realizou seu famoso discurso.
*Fonte: Deutsche Welle (DW), via Carta Capital.